Projeto de lei pretende punir responsáveis que não comparecerem à escola dos filhos

Projeto de lei pretende punir responsáveis que não comparecerem à escola dos filhos

Proposta, aprovada neste mês na Comissão de Educação, prevê sanções semelhantes às impostas a eleitores faltosos sem justificativa, como ficar impedidos de participar de concursos públicos ou requerer passaporte

Diante da informação de que um projeto de lei pretende punir quem não comparecer à escola dos filhos ao menos uma vez no bimestre, um grupo de pais do Colégio Batista, na zona norte de Porto Alegre, quase não conteve o riso. Não se trata de deboche à proposta, mas uma reação espontânea à improvável possibilidade de eles descumprirem a lei, caso seja aprovada. É que essa turma, batizada de Confraria CB, está sempre na instituição, acompanhando de perto o que se passa na vida escolar dos filhos, alunos do 6º ano do Ensino Fundamental.

– Acho que aparecemos aqui quatro vezes só em um mês – adianta a professora Denise Ruzzante Meira, 45 anos, mãe de Laura, 12.

Esses pais se conheceram há 11 anos, no vaivém dentro do colégio dos filhos, e mantêm uma relação de amizade, que envolve comprometimento coletivo com a educação das crianças. Trocam informações, discutem medidas e projetos pedagógicos adotados e não se furtam de compartilhar com a direção suas angústias. Estão presentes na escola.

Mas a Confraria CB não é uma regra nas instituições de educação brasileiras, e isso motivou o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) a apresentar, em 2012, um projeto de lei que obriga pais ou responsáveis por alunos da educação básica a comparecerem na escola das crianças, sob pena de sofrerem sanções semelhantes às impostas a eleitores faltosos sem justificativa, como ficar impedidos de participar de concursos públicos ou requerer passaporte. A proposta foi aprovada neste mês na Comissão de Educação, que analisa o mérito de proposições que tratem de normas gerais da educação, e encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que avaliará a constitucionalidade e os aspectos jurídicos do projeto, como a definição de quem aplicará as punições e fiscalizará o cumprimento da lei. Caso seja aprovado, segue para a Câmara. O texto tramita sob críticas de pais, educadores e ativistas na área da educação, que questionam o aspecto punitivo da proposta.

– Entre outros temas, vamos conversar sobre isso com os pais hoje, mas acredito que punir não é o adequado. Temos questões mais importantes para resolver. Há alunos que nem professores têm na sala de aula – diz a presidente da Federação das Associações e Círculos de Pais e Mestres do Rio Grande do Sul, Berenice da Costa.

Ir à escola não pode ser um sacrifício

O senador Cristovam Buarque lança mão de pesquisas e de sua experiência como estudioso do tema para justificar a medida. Para ele, não há como fazer boa educação sem a participação da família, mas os pais brasileiros não estão dando prioridade à essa comunhão. Falta de tempo é um dos motivos mais citados para justificar a ausência em reuniões e encontros com professores e diretores. Buarque rebate a justificativa.

– É porque isso não é uma prioridade. Educação não é só escola, e na nossa democracia só se fala nos direitos, não nas responsabilidades. Que educação é essa em que é um sacrifício para um pai ir à escola? – questiona.

Coordenadora de Gestão de Aprendizagem do Departamento Pedagógico da Secretaria da Educação do Estado, Nelnie Lorenzoni conta que a ausência dos pais em reuniões e avaliações é relatada frequentemente por educadores. Entrega de boletins despertam um interesse um pouco maior entre os pais, mas a aproximação com a escola é muito aquém do esperado.

– Não temos uma pesquisa oficial sobre ausência dos pais, mas é uma realidade relatada pelas direções. A maioria se ressente muito pela baixa presença dos responsáveis quando são chamados. A escola precisa da família, mas não adianta aparecer só para pegar o boletim – avalia Nelnie.

O que prevê o projeto

Obrigações

Os pais ou responsáveis legais ficam obrigados a comparecer periodicamente às escolas de seus filhos para acompanhar o desempenho escolar deles e o processo educativo.

– O comparecimento deve ocorrer pelo menos uma vez a cada dois meses letivos, em todas as escolas públicas e privadas da educação básica do país.

– Entende-se por “comparecimento” a participação em reuniões oficiais de pais e mestres ou o diálogo individual com professores, neste caso, em espaço e tempo apropriados, de forma a não prejudicar o trabalho do professor nem a participação nos conselhos escolares ou similares.

– O atestado de comparecimento dos pais ou responsáveis será emitido por um servidor da direção da escola ou, na falta dele, pelo professor da criança ou do adolescente.

– O projeto prevê que o pai ou responsável poderá faltar ao trabalho pelo tempo necessário sem prejuízo ao salário.

Punições

– O comparecimento deve ocorrer pelo menos uma vez a cada dois meses letivos, em todas as escolas públicas e privadas da educação básica do país.

– Entende-se por “comparecimento” a participação em reuniões oficiais de pais e mestres ou o diálogo individual com professores, neste caso, em espaço e tempo apropriados, de forma a não prejudicar o trabalho do professor nem a participação nos conselhos escolares ou similares.

– O atestado de comparecimento dos pais ou responsáveis será emitido por um servidor da direção da escola ou, na falta dele, pelo professor da criança ou do adolescente.

– O projeto prevê que o pai ou responsável poderá faltar ao trabalho pelo tempo necessário sem prejuízo ao salário.

Críticas a punição por ausência

Gerente de conteúdo do movimento Todos pela Educação, Ricardo Falzetta acredita que a proposta do senador Cristovam Buarque tem as melhores intenções, inclusive por prever a possibilidade de o trabalhador faltar ao serviço para comparecer à escola do filho, sem prejuízos no salário. No entanto, ele não concorda com a punição nos casos de ausência. O efeito, aposta, seria negativo justamente na parte mais importante do contexto escolar: o aluno.

Falzetta ressalta que a participação dos pais na vida escolar dos filhos precisa ser espontânea, para que a criança se sinta acolhida e perceba que eles de fato se preocupa com as atividades escolares e com seu desenvolvimento intelectual.

– O aluno precisa perceber que a sua educação está na pauta, faz diferença. O pai indo obrigado à escola anula esse efeito – diz.

Entre as medidas que poderiam ajudar na aproximação pais/escola, segundo Falzetta, está diagnosticar com as turmas, desde o começo do ano letivo, como funciona a rotina da família e buscar horários alternativos para os encontros de pais. Outra medida seria pensar na tecnologia como aliada nessa relação e reforçar com os gestores a importância de priorizá-la no ambiente escolar:

– Há alternativas, e elas precisam ser buscadas, antes de uma legislação punitiva.
Em 2014, a participação dos pais ou responsáveis na vida escolar dos alunos da educação básica foi abordada em uma pesquisa do movimento Todos Pela Educação, em parceria com as fundações Itaú Social, Maria Cecília Souto Vidigal e Roberto Marinho e os institutos C&A e Unibanco. Foram entrevistados mais de dois mil pais ou responsáveis por crianças e jovens, entre quatro e 17 anos, de escolas públicas e privadas de todo o país, da Educação Infantil ao Ensino Médio.

Retirado de http://zh.clicrbs.com.br/

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